sábado, 19 de novembro de 2011

Planos de saúde não cobrem despesas de tratamentos caros

Adriana Leocadio



Estudo mostra que é preciso ir à Justiça para ter gastos cobertos; 88% dos casos são julgados a favor dos segurados

As operadas de planos de saúde no Brasil recusam a maioria dos pedidos de cobertura de tratamentos de doenças como câncer e do coração. A informação faz parte de um estudo realizado pela Faculdade de Medicina da USP, que analisou 782 decisões judiciais tomadas entre 2009 e 2010.

Responsável pelo levantamento, o pesquisador Mário Scheffer diz que os procedimentos mais recusados pelas operadoras são a quimioterapia e a radioterapia, ambos ligados ao tratamento do câncer. Eles representam 35,9% das ações
julgadas em segunda instância pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP), em 2009 e 2010.

A pesquisa também revela que os planos freqüentemente se negam a custear próteses, exames ambulatoriais e medicamentos aos segurados. Além disso, as operadoras também passaram a recusar o atendimento à pacientes com obesidade mórbida. A alegação dada pelos convênios é de que o tratamento é uma intervenção estética, e não um problema que pode colocar em risco a vida dos pacientes.

O estudo mostra que, em 88% dos casos, os juízes foram favoráveis aos segurados. A maioria das decisões foi fundamentada no Código de Defesa do Consumidor e na Lei 9.656/98 que rege os contratos de plano de saúde.

Em apenas 7,5% dos casos, a Justiça aceitou as alegações dos planos para recusar a cobertura parcial ou total dos gastos com tratamentos médicos.

O que se verifica na prática, é que a justiça é o caminho mais rápido para que o consumidor consiga se submeter a alguns procedimentos médicos, geralmente de maior complexidade, aqueles negados pelos planos de saúde. Isto porque na maioria das vezes, o Poder Judiciário entende que, como se tratam de cláusulas determinadas pela empresa de saúde, muitas vezes ferem o bom senso e a boa-fé do consumidor.

Quando há negativa do plano para efetuar qualquer procedimento, o consumidor tem que se socorrer ao Judiciário. O importante é que este consumidor tenha tudo documentado, qual seja o pedido médico detalhado, indicando da necessidade do procedimento cirúrgico; da autorização da cirurgia junto ao plano; a negativa do plano, dentre outros. Todos estes documentos são importantes uma ação judicial.

O pedido deve ser formulado de acordo com a urgência de cada caso, sendo que na maioria das vezes é para atendimento imediato, devendo o advogado diligenciar para que o Juiz aprecie com a máxima urgência, bem como exigir da parte contrária o seu imediato cumprimento, podendo ser, em alguns na maior parte dos casos liberado em questão de horas, em outros em até 48h. O que agiliza o processo, é o conhecimento do profissional que está a frente da ação das peculiaridades deste segmento, para que antecipe os problemas e conheça melhor o exercício do direito, assim como em determinados casos de interesse político. 

Adriana Leocadio é especialista em Direito e Saúde, Bacharel em Direito e Marketing, Membro da Organização Mundial da Saúde e Presidente da Ong Portal Saúde.

Para maiores informações: contato@portalsaude.org – fones: (11) 5044.2433 / 9905.6373 – www.saudeejustica.blogspot.com

quinta-feira, 10 de novembro de 2011

A quem interessa a relação médico paciente ?

A relação médico-paciente é parte integrante do cotidiano de milhares de profissionais. Para evitar uma abordagem idealista ou meramente afetiva desta questão, é necessário investigar como ela está relacionada ao conhecimento médico e à relação mais geral entre medicina e sociedade. Na verdade, longe de ser aleatória, esta relação, da forma como foi estabelecida, pode ser vista como um instrumento de difusão e manutenção do poder do Estado e da instituição médica sobre a sociedade.
Para modificar esta prática, o autor propõe duas abordagens, relativas a campos distintos da prática médica: os campos hospitalar e extra-hospitalar. Na área extra-hospitalar, a humanização da prática médica dependeria, basicamente, de uma formação profissional abrangente, de modo a adaptar o médico às demandas inerentes a esta área, onde o raciocínio fisio-patológico mostra-se freqüentemente limitado. No campo hospitalar, a humanização do ato médico dependeria mais diretamente da atuação integrada de uma equipe multi-profissional.

O assunto da relação médico-paciente (RMP) tem sido tratado extensamente por numerosos autores. Entretanto, na maioria das vezes, suas análises são lidas e debatidas por profissionais distantes da prática clínica, o que não deixa de conferir a estas discussões uma aparência de inutilidade. A Medicina, como comenta Clavreul (1983), segue indiferente ao que dela se diz.

Para a maioria dos clínicos, a questão da relação com seus clientes remete basicamente a algumas aulas da graduação, ou aparece na forma de um discurso mais ou menos lírico, utilizado em conversas entre colegas, freqüentemente sem maiores correlações com a realidade vivida nos consultórios e enfermarias. Mostra-se, desta forma, despossuída de qualquer conteúdo positivo ou intrínseco às aptidões objetivamente exigidas para o cuidado dos doentes; portanto, um conceito idealizado. Por outro lado, boa parte das críticas dirigidas à forma como se estabelece usualmente esta relação carece igualmente da proposição de alternativas factíveis dentro da realidade cotidiana dos profissionais de saúde e, portanto, compartilham da mesma ilusão idealista.

Um exemplo bastante prático disto é a abordagem do aspecto afetivo da RMP. Ora, a afetividade existe inevitavelmente, na medida em que ela se refere a um contato entre pessoas, embora concordemos com Sartre (Birman, 1980) quando considera a relação com o médico como um fato original, diferenciado das características das outras relações, o que certamente não invalida a afirmação anterior. Desta forma, por mais que se procure manter um distanciamento, sentimentos estarão sempre presentes, nas mais variadas formas, como afeição, empatia, antipatia, aversão, medo, compaixão, erotismo, etc. Pode ocorrer uma negação desta realidade por parte de alguns profissionais, enquanto outros, ao contrário, tendem a reduzir a RMP exclusivamente ao seu conteúdo afetivo, definindo-a a partir de categorias como amizade, carinho, etc. Não pretendemos menosprezar este aspecto da RMP. Entretanto, parece-nos mais adequado aceitar simplesmente o caráter imprevisível dos afetos presentes na consulta, na medida em que envolvem um campo alheio à racionalidade humana. É um pré-conceito considerar que o médico deva ser amigo ou gostar de seus pacientes. Este pré-conceito é incapaz de dar conta da prática clínica concreta, e reduzir a RMP a uma questão afetiva significa esvaziá-la de qualquer conteúdo instrumentalizável, destinando-a ao universo do aleatório. Aleatório aqui não significa, de modo algum, neutro, porque, na verdade, este esvaziamento ajuda a encobrir outros mecanismos bem mais sutis onde a RMP, da forma como é estabelecida, segue produzindo seus efeitos no indivíduo e na sociedade.

De todo modo, talvez pelo fato de atuarmos na clínica médica, temos a esperança de, mesmo de forma bastante restrita, contrariar a tradição de distância entre este debate e a prática médica, e levantar questões que atendam aos interesses dos colegas e colaborem com sua atividade profissional. É, portanto, uma intenção pragmática que justifica este texto, mesmo considerando que os aspectos levantados mereceriam um tratamento por um viés mais teórico.